quinta-feira, 25 de abril de 2013



Falando um pouquinho sobre a Educação de Surdos

A Questão da Educação de Surdos 
Professora Doutora Nídia Regina Limeira de Sá

     
No Brasil e no mundo ainda tem grande força a abordagem educacional
oralista. Oralismo é o nome dado àquelas abordagens que enfatizam a fala
e a amplificação da audição e que rejeitam, de maneira explícita e
rígida, qualquer uso da língua de sinais. Assim, “o oralismo tanto é uma
ideologia quanto um método” (Wrigley, 1996, p. 15).
      Aqui
e ali instituições anteriormente comprometidas com uma visão oralista,
pressionadas por diversos movimentos de resistência, começam a abrir
oportunidades para a penetração da língua de sinais em seus territórios
(destaco que nem sempre o fato de se suportar a presença da língua de
sinais significa permitir a presença da comunidade surda ou de adultos
surdos nos espaços educacionais, o que, na maioria dos casos continua
sendo indesejável). Assim, com a pretensão de sair do Oralismo – agora
já um tanto mal visto – muitas instituições afirmam estar aceitando a
língua de sinais e trabalhando sob a égide da Comunicação
Total.
    
Owen Wrigley comenta: “A Comunicação Total veio significar a mistura da
fala e língua dos sinais mais convenientes a cada professor (...). O
uso da língua dos sinais nesses ambientes mostrou-se ser, na melhor das
hipóteses, apenas ‘fala apoiada pelos sinais’, que é inadequada para ser
compreendida por uma criança surda como uma mensagem completa (...). A
‘Comunicação Total’ é qualquer coisa, menos total, e raramente comunica”
(ibid., p. 15). 
    
Num anterior trabalho sobre a educação de surdos, analisando discursos
de profissionais e de adultos surdos percebi que o termo “Comunicação
Total” é usado com diferentes entendimentos: a) pode referir-se a um
posicionamento “filosófico-emocional” de aceitação do surdo e de
exaltação da comunicação efetiva pela utilização de quaisquer recursos
disponíveis; b) pode referir-se à abordagem educacional bimodal que
objetiva o aprendizado da língua da comunidade majoritária através da
utilização de todos os recursos possíveis além da fala, quais sejam:
leitura dos movimentos dos lábios, escrita, pistas auditivas, e, até
mesmo de elementos da língua de sinais; c) pode referir-se a um tipo de
bimodalismo exato, que faz uso simultâneo ou combinado de sinais
extraídos da língua de sinais, ou de outros sinais gramaticais não
presentes nela, mas que são enxertados para traduzir a linearidade da
língua na modalidade oral e para auxiliar visualmente o aprendizado da
língua-alvo, que é a oral” (Sá, 1999, p. 99-102). Seja como for,
qualquer abordagem que não considere a língua de sinais como primeira
língua, e a língua utilizada por surdos proficientes como referencial, é
uma mera conveniência para com os profissionais ouvintes que trabalham
na área da surdez.
      Atualmente estão sendo divulgados trabalhos educacionais bilíngües, ou “com bilingüismo”, os quais
pressupor
a língua de sinais como primeira língua, nada diz quanto à questão das
culturas envolvidas, das identidades surdas, das lutas por poderes,
saberes e territórios, e, finalmente, nada deixa definido quanto às
políticas para as diferenças. 
    
Ora, quando se opta por interpretar a língua de sinais como primeira
língua a ser considerada no processo educativo dos surdos, tem-se que
entender que tal proposição, como decorrência, altera toda a organização
escolar, os objetivos pedagógicos, a participação da comunidade surda
no processo escolar, bem como nega a necessidade da integração escolar.
   
No Brasil a integração escolar de surdos tem sido defendida pelo poder
oficial que, com um discurso que apela às emoções, tem tentado
disseminar a idéia de que é um ato de discriminação colocar os surdos,
bem como qualquer outro tipo de “deficiente”, tristemente isolados em
escolas especiais – atribui-se que é um atentado à modernidade, ou ao
avanço tecnológico, ainda se desejar manter grupos “isolados”.
Defende-se a idéia de que colocar os “deficientes” junto às pessoas
“normais” é um sinal de grande avanço impulsionado pela solidariedade. O
foco é colocado nas concessões e ajustes que as escolas e instituições
devem fazer para “receber” a estes.   
    
A idéia é manter “todos” juntos para assimilar a diversidade. O que não
fica muito explícito, no entanto, é que a separação do outro pode ser
conseguida, apesar da aproximação física, por restrição da comunicação;
ou seja: “separação com o propósito de criar uniformidade” (Wrigley,
1996, p. 52).
    
A inclusão que defendemos é aquela que compreende o acesso igual ao
conteúdo curricular – a questão da dispersão física das crianças
ouvintes não é o problema central. Afirmo com Wrigley: “quando a
diferença da surdez é obliterada, através da insistência tanto na
identificação social como ‘semelhante aos que ouvem’ quanto numa
modalidade da comunicação centrada na oralidade, então a inclusão justa,
compreendida como acesso ao conteúdo curricular, é funcionalmente
negada” (Wrigley, 1996, p. 91).
      Incluir surdos em salas de aula regulares, invibializa o desejo dos surdos de construir saberes, identidades e 
culturas
a partir das duas línguas (a de sinais e a língua oficial do país) e
impossibilita a consolidação lingüística dos alunos surdos. Não se trata
de apenas aceitar a língua de sinais, mas de viabilizá-la, pois todo
trabalho pedagógico que considere o desenvolvimento cognitivo tem que
considerar a aquisição de uma primeira língua natural (este é o eixo
fundamental do “bilingüismo”, tal como o defendemos). De outra forma,
como a criança estabelecerá contato com o mundo de representações que a
cerca? Como tecerá suas próprias significações? Ao contrário, caso a
criança surda tenha uma língua natural, ela contará com a base para a
aquisição de uma segunda língua, pois terá as condições ótimas para o
desenvolvimento de sua cognição, de sua auto-estima e de sua identidade.
    
Ora, aos defensores da “integração escolar equânime”, poderíamos
perguntar: é possível ter escola onde haja o mesmo número de crianças
surdas e ouvintes? Dá para ter o mesmo número de professores surdos e
ouvintes, e que todos sejam fluentes nas duas línguas? Ora, ainda que
isto fosse possível, ainda assim não haveria mães, pais, avós, e irmãos
surdos para distribuir a todas as crianças surdas... Enfim, uma
integração escolar equânime fica bem apenas em discursos.
    
Quando se defende a língua de sinais como primeira língua não se está
afirmando que o desenvolvimento cognitivo depende exclusivamente do
domínio de uma língua, mas se está crendo que dominar uma língua garante
melhores recursos para as cadeias neuronais envolvidas no
desenvolvimento dos processos cognitivos. Assim, objetivamente, o que
pretendem os defensores do “bilingüismo” é garantir o domínio de uma
língua para dar bases sólidas ao desenvolvimento cognitivo do indivíduo
(Fernandez, 2000, p. 49). Destaco, com Eulália Fernandez, que o uso do
termo “bilingüismo”, no entanto, também exige o cuidado de não se esta

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